História de Pai João
do Congo:
“Saiba, ó filho meu. Que existiu uma época muito distante, um povo entre as diversas raças humanas que passaram, como estrelas espalhadas no firmamento, sábio e culto, filosófico e sonhador. Sonhavam em retornar ao seu lar sidério, situado entre as estrelas da constelação do Cocheiro, e por isso, os mais dotados espiritualmente, insistiam em olhar o céu e suspiravam de saudade.” Naquela região onde hoje se encontra Madagascar, há muitos e milhares de anos. Alto e esguio, de compleição delicada, olhos brilhantes e profundos, Nalmyskar, o sacerdote do templo de Obhaluayê olhava as conjunções do céu para compreender os vaticínios que chegaram através de seus sonhos, com relação aos acontecimentos prestes á desabar sobre seu país.
Com seu cajado na mão
direita, permanecia de pé ao som do mar e á luz dos espaços
infinitos, e assim permaneceu por longas horas, em contemplação
silenciosa. Revia o sonho e cada parte triste...o povo inteiro seria
colocado á prova por desprezar a grande lei de zambi! E agora os
Araxás através de seus sonhos anunciavam a grande sina que se
abateria sobre todos como remissão dos pecados...A sabedoria milenar
há muito fora deturpada por sacerdotes corrompidos, que se deixaram
levar pelos ouropéis e vaidades humanas, patrocinando verdadeiras
orgias, descambando para a magia negra.
Triste sina de um povo
que já foi a aurora de uma civilização grandiosa! Muitos serão
banidos, degredados, irão para longe de seus lares, como escravos de
uma raça que não tardaria em surgir no horizonte, em busca de
conquista e ouro.
Famílias inteiras
separadas, genocídio, depravação e miséria seria o castigo deste
povo orgulhoso e vingativo que ousou contrariar as leis sagradas dos
Araxás.a sagrada lei de zambi! Os grandes e brilhantes olhos do
sacerdote derramavam copiosas lágrimas, vertidas de seu coração
sincero, pois guardava as leis sagradas e vivia de acordo com os mais
altos ensinamentos de sua escola de iniciação. Sabia que voltaria
para seu lar sidério, para a sua amada estrela situada na
constelação do Cocheiro, mas e o seu povo? Voltaria á vê-los?
Enquanto assim permanecia, não percebeu sublime Entidade postada á
seu lado, que lhe observava com profundo amor e carinho.
Uma brisa fresca roçou
seu rosto magro e escuro como ébano, e uma voz se fez ouvir, como
que vinda da distância que ele mesmo contemplava da sua saudosa
estrela“.Nalmyskar! o grande Zambi te abençoa através dos
sagrados Araxás! Trago-te a promessa de que, tão logo seu povo
sinta o braço pesado e longo do carma, você retornará para cumprir
missão junto aos teus mais caros afetos! Numa terra que ainda está
por ser descoberta, muito além mar, tu irás voltar para o seio do
povo que tanto amas, e assim auxiliá-lo na difícil missão de
retornarem aos braços de Zambi, através da dor e do sofrimento.
Os Grande Senhores da
Aumbhandhã, os Mestres da Luz ouviram tuas preces, pois que tu
guardaste a lei de Zambi em seu coração! Retornarás como Guia de
uma futura religião que está para nascer nas terras do Cruzeiro do
Sul,e inspirarás com teu exemplo de humildade os teus filhos
deserdados. Serás conhecido como Pai João do Congo por muitas
gerações que te sucederão ao longo da jornada que ora se inicia em
tua experiência íntima, e terás a alegria de ver voltar ao aprisco
do amor de Zambi muitos de teus filhos desgarrados, que com teu amor,
com tua dedicação e humildade irás inspirar aos dias melhores no
futuro.
Por agora descansa,
prepara teu espírito para as horas amargas que se abaterão, logo
que a lua mude seu ciclo, para alertar mais uma vez teu povo das
severas lições que lhe aguardam! Paz e Luz, Nalmyskar, abençoado
dos Araxás!” Com os olhos marejados, e profundamente emocionado, o
velho sacerdote retornou a passos lentos em direção de sua aldeia,
enquanto a lua, parecia compartilhar com a tristeza do velho ancião.
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